segunda-feira, julho 26, 2010

Só acontece comigo.

Se você já procurou emprego sabe que o processo de conseguir uma entrevista e realizá-la de forma perfeita é complicado e muito estressante. Tudo conta, desde o currículo que você envia, passando pela carta de apresentação, até às roupas que você usa no dia da entrevista e o modo como você se expressa. Deixar a bolsa no colo, entre você e o entrevistador, pode ser um mal negócio, não olhar nos olhos pode dar a impressão de que você não fala a verdade... e assim vai...  Existem milhões de regras.

Entretanto, existem coisas que só acontecem comigo. Para quem não sabe, estou procurando emprego desde junho. Sou formada em jornalismo e tenho experiência em assessoria de imprensa, redação e etc. O mercado do jornalismo pode ser muito cruel e o nicho deste ramo que mais oferece vagas de emprego é o de assessoria de imprensa. Desandei a disparar e-mails com o meu currículo para inúmeras agências onde eu tivesse interesse em trabalhar.



Na semana passada recebi um e-mail respondendo a um que havia enviado. O fato é que receber uma resposta de recrutadores, empresas e entrevistadores, por si só já é um milagre! Seja quando você tenta conseguir uma entrevista, seja quando você já foi entrevistado e não sabe se já perdeu a vaga ou não. Desta vez, a pessoa X, da agência Y me enviou uma mensagem explicando que possuía uma vaga em aberto e qual era o perfil da vaga. Baseada na minha experiência anterior, a vaga não era para mim. Entretanto, eu estou doida para tentar coisas novas já há algum tempo e respondi com o máximo de sinceridade possível, explicando minha situação e contando sobre algumas coisas que eu já tinha feito que poderiam ser - de alguma forma - pertinentes à vaga.

No dia seguinte, já não esperava nenhuma resposta e acreditava que seria apenas mais uma empresa que jamais me responderia. Tudo bem, eu já estava acostumada e continuei minha vida plantando begônias no Farmville e construindo meu estábulo. Fechei meu e-mail, pois fico obcecada com a possibilidade de qualquer e-mail que chegue seja de alguma empresa dizendo como meu currículo é impressionante e eles têm o trabalho perfeito pra mim, que pagarão R$10 mil reais mensais com todos os benefícios por cinco horas por dia e que eles sentem muito por não poderem me pagar mais, pois eles sabem que eu mereço muito muito muito mais do que eles poderiam me oferecer.

Fechar meu e-mail, nesse caso, é uma coisa saudável, pois eu fico apertando "Caixa de Entrada" a cada vinte e oito segundos. Quando vejo um numerozinho ao lado da "Caixa", corro alucinada acreditando piamente que o e-mail que tanto espero finalmente chegou. Geralmente é algum e-mail marketing de alguma empresa de comércio eletrônico me apresentando as novas ofertas imperdíveis que, mesmo que fossem realmente imperdíveis, eu não poderia aproveitá-las pois não tenho emprego e, por consequência, dinheiro.

Eu gosto de fechar a caixa e ter a agradável surpresa de - quando abrí-la novamente - encontrar um e-mail importante. Parece que quando meu e-mail está aberto, os e-mails importantes se recusam a vir. Então eu fecho e fico aflita pensando "já posso abrir?", "será que chegou algo?". Na tarde de sexta-feira, como que por um milagre, tinha esquecido do meu e-mail completamente. Estava me sentindo relaxada e conversando com o meu namorado, quando lembrei de repente que fazia milênios que não dava uma inocente olhadinha no e-mail.

Ao abrir, foi um choque: tinha, sim, um e-mail importante! A pessoa X, da agência Y queria marcar uma entrevista comigo para um dia e horário em que eu não poderia. Sou desempregada, fico em casa todos os dias da semana e a Lei de Murphy diz que se alguém quiser marcar uma entrevista comigo vai ser no único dia da vida em que eu não vou poder. Respondi ao e-mail sugerindo uma outra data, explicando que não poderia e fiquei apertando o botão da "Caixa de Entrada" non-stop. Recebi um e-mail do Privalia, um daquele HORROROSO BrandsClub, um do Englishtown e outro do Port Casa, oferecendo lençóis por preços imperdíveis. Fechei o e-mail.

E me obriguei a esquecer. Perto das 15h, abro o Gmail e tem outro e-mail da pessoa X, da agência Y, dizendo que não podia no dia que sugeri e perguntando se daria tempo de eu ir naquele mesmo dia, até as 18h.  Pânico. Pavor. Corre!

Moro em São Bernardo do Campo e a entrevista seria em São Caetano do Sul, não é longe, mas não tinha tomado banho e não sabia como chegar. E eu não tenho carro. Respondi concordando, dizendo que nos veríamos até as 18h. Ela me enviou instruções sobre "como chegar", presumindo que eu estava de carro.

Liguei pra minha mãe, que trabalha em São Caetano e pedi pra ela descobrir como chegar lá. Enquanto isso, VOEI para o chuveiro. Estava esfregando o shampoo na cabeça, nos primeiros cinco minutos de banho e...a água começou a ficar fria e..e..e.e.. a esfriar..e..e..e..e de repente, não tinha mais nenhuma gota de água pingando do chuveiro. Gritei desesperada! Luzia, a diarista que estava na minha casa quis saber se eu tava morrendo e eu só sabia perguntar se não tinha mais água. Claro que ela disse que não. E eu amaldiçoei a quinta geração dela por ela não ter me avisado.

Corri, pelada, pro chuveiro da minha mãe. Nenhuma gota. Abri todas as torneiras. Extraí seis ou sete gotículas de cada uma, mas não conseguia tirar o shampoo. Meu olho queimava, com a espuma dentro dele. Apelei. Peguei a torneirinha higiênica e descobri que ela não alcançava o box do chuveiro. Enfiei, então, a cabeça em cima da privada e apertei a duchinha. Mais seis gotículas. Eu gritava. A Luzia, coitada, não entendia nada.

Liguei pra minha mãe desesperada. Saí correndo, peguei uma leiteira e enchi de água MINERAL do filtro - que, óbvio, estava acabando. Joguei água do filtro na cabeça, no corpo, lavei tudo o que poderia exalar algum tipo de odor corporal e guardei um pouco da água para escovar os dentes.

Me tranquei no quarto e passei creme cheiroso em cada centímetro da minha pele, joguei talco e perfume e me vesti. Sequei meu cabelo - duro de shampoo - e passei maquiagem. Fui de tênis, levando o sapato de salto alto numa sacolinha de feltro. Corri para o ponto (não poderia correr de salto se mal me aguento em pé nele) e nada do ônibus chegar.

Quase meia hora depois, o dito cujo chega e eu tava crente que o cobrador me ensinaria onde eu deveria descer e como deveria chegar. Cobradores sempre sabem tudo. Mas não esse. Ele não sabia onde ficava nada, apenas a Av. Goiás (dã, isso todo mundo sabe. Até eu!) e ficava no celular com a neta, explicando que daria um celular no aniversário dela mas não tinha dinheiro para festa. E a criança era pentelha e insistia na festa. E ele prometeu que faria uma festa de quinze anos (azar o dele, vai gastar muito mais). "E só faltam quatro anos! Não vai demorar nadinha", dizia o cobrador.

A mocinha do meu lado me avisou onde eu deveria descer, mas não conhecia a rua. Coisa que, aliás, descobri que ABSOLUTAMENTE NINGUÉM naquela cidade conhecia! Começou aí a pior parte da minha saga. Perguntei em todas as bancas. Em todos os bares, em todos os restaurantes, lanchonetes, banquinhas de flores, pontos de táxis, mendigos... Ninguém conhecia. Mas todo mundo achava que ficava em alguma direção. Devo ter andando uns dois quilômetros. E, como vocês lembram, eu tava atrasada.

Foi aí que começou a garoar. Claro. Sabe aquela garoinha beeeeeem fina, gelada, e que não para de cair nem por um segundo, sempre em quantidades enormes? Era essa. E eu ainda estava perdida. Eu sou uma garota prevenida e levei guarda chuva, mas sabe quando a garoa vem de todas as direções? Pois é. Nem preciso dizer o que começou a acontecer com o meu cabelo escovado e a minha maquiagem. Eu suava, de tanto andar, e a garoa me molhava, pra ajudar.

Garoinha fininha e gelada que não para


Eu sempre acredito que, quando não se sabe o caminho, o melhor a fazer é conversar com um taxista. Eles sempre têm a solução. Quando, então, falei com o taxista, ele me mandou fazer um caminho que, obedientemente, fiz. E não cheguei a lugar nenhum. Na verdade, estava quase chegando em Tocantins, já. E não chegava nem perto da rua onde eu precisava ir. No caminho inteiro parei todo tipo de pessoas que vi pela frente. Cada um dizia uma coisa. Ninguém conhecia a rua, mas todos achavam que era pra algum lado. E eu, perdida, fui para todos os lados sugeridos.

Até que, subindo uma ladeira, parei um cara numa esquina, do lado de fora de uma papelaria grande. E, como de costume, ele não conhecia a rua. Mas foi mais esperto e chamou um menino que trabalhava na papelaria e morava ali na cidade mesmo. E ele não conhecia a rua. Mas foi ainda mais esperto e me levou pra dentro da papelaria para me assaltar olhar no Google Maps (que eu olhei vinte vezes antes de sair de casa, mas que não significou muita coisa pra mim).  Acho que eu aparentava uma pessoa tão sofrida, que ele procurou exatamente o caminho que eu devia fazer, me ensinou dezoito vezes, me deu água e ao chegar na calçada, me ensinou de novo, dessa vez apontando a rua onde eu deveria virar.

Como eu já tava escolada com esse povo de São Caetano, parei uma menina ("ai, eu não sei, pergunta pra aquele vigia ali"), uma senhora ("eu não sou daqui querida, desculpe") e um mais um homem ("hum, acho que fica pra lá") para perguntar sobre a rua.

Eu já não aguentava mais. Queria desistir. Não era possível que algum emprego valesse tudo aquilo! Foi então que comecei a sentir o cheiro da tal rua. Sabe quando você sabe que está chegando perto? Intuição, talvez. Talvez fosse meu corpo implorando. Talvez fossem alucinações. E parada em frente a uma subidinha, mais uma vez, perguntei a um porteiro de uma escola. Moço, POR FAVOR, onde é a rua Sergipe? E ele, graciosamente, para meu alívio, me informou que era aquela rua que estava exatamente à minha frente. Eu não podia acreditar.

Olhei no relógio e eram 17h50. A pessoa X da agência Y havia deixado bem claro que poderia me atender apenas até as 18h. Depois disso, não mais. Procurei na bolsa o papel onde eu havia anotado o endereço e descobri que anotei diversas coisas, exceto o número da casa. Aleatoriamente, imaginei que seria uma casa grande do lado direito da rua. Olhei em volta e não encontrei nenhum lugar para sentar. Sentei na rua, ao lado de enormes sacos de lixo. Eu deveria estar com o mesmo cheiro, então, tudo bem, nada mais importava naquela hora. Sentei ali, descalcei os tênis e meias e subi nos saltos.

Atravessei a rua, quase caí e toquei a campainha. Pela primeira vez, algo havia dado certo: eu havia chegado ao lugar correto.O menino que me atendeu pareceu assustado com a minha aparência e eu implorei a ele que ali fosse o local certo. Ele assentiu com a cabeça, me olhando com restrições e com os olhos arregalados. Me pediu para entrar e ofereceu água. Eu realmente deveria parecer mal. Eu aceitei a água e tentei me arrumar de algum jeito, mas não tinha nada que eu pudesse fazer. Eu suava, podia sentir o suor escorrendo perto das bochechas. Tive medo de me olhar no espelho, então não me olhei. Eu me sentia tão triste que não sabia mais o que fazer.

Quando fui chamada, subi para a entrevista, com a pessoa X e mais uma pessoa, a Z. Falei tão rápido e me perguntaram tão pouca coisa que quando eu percebi, eram 18h15 (tudo isso para menos de quinze minutos de conversa) e eu estava na rua, na chuva, quase caindo na calçada de novo, procurando meu caminho de volta.

Claro que eu me perdi. Claro que perguntei para pelo menos doze pessoas (impressionantemente solícitas) sobre o caminho de volta. Claro que, quando cheguei à rua, ela era escura e com murões de uma fábrica dos dois lados. Olhei um bar na esquina e só vi homens, dezenas eles. Onde estavam as mulheres? Eles mataram, pensei comigo mesma. Aquela rua parecia totalmente de um filme de terror e a garoinha fina contribuía.

Eu poderia ter ido para qualquer lugar do mundo, Mauá, Ribeirão Pires, Ipiranga, Tocantins. Até para o lugar que não existe, o Acre. Mas o meu ônibus não passava. Esperei por 50 minutos no ponto de ônibus escuro. E quando meu ônibus passou, sentei em um banco embaixo de uma goteira.

Só comigo acontecem essas coisas.
Prazer, Zica é o meu nome do meio.

8 palpites bem-vindos!:

Michelle Louzeiro Nazar disse...

Sei bem o que é isso. Passei por todas as crônicas, nem sempre divertidas, de alguém que busca um emprego (também nem sempre dos sonhos!). Adorei conhecer seu blog! Bjks ;)

Aline disse...

uahauhauahuahau, "Prazer, Zica é o meu nome do meio." aca=bou comigo!

muito, muuuito bom.

http://umdiaamaisblog.blogspot.com/

JP Santos disse...

--`onde que o Acre não existe heimmmmmmm >:(

mas, que situação heim baby... que diaaa.

Sister disse...

kakakak, tadiha de vc flor... As vezes acontece umas coisas desse tipow comigo. =/

Unknown disse...

Sinto muito por vc. Sou jornalista, nasci em São Caetano, e criei uma raiva danada, tanto que mudei para São Bernardo. Entendo perfeitamente sua dificuldade em se localizar em uma cidade labiríntica. Mas eo trampo rolou?

Denise disse...

Desculpa, mas me diverti horrores lendo.
E acho que você devia colocar o link desse blog no seu currículo. Sério.
Não pros entrevistadores terem dó de vc, mas pra verem a qualidade do seu texto. ;)
Bjs

Anônimo disse...

Menina,seu blog é lindo,interessantissimo,amei conhecê-lo,e,que livro heim,ainda espero lê-lo,digo assim devido aos anos que me restam.Mas,Deus é o provedor de tudo e de todos.Beijos.Marluce,em Arez,no RN-Natal -Brasil

marluceairessilva@hotmail.com disse...

Blog se faz assim,pesquisando,criando e pensando alto.Um livro será a melhor realização desse blog,por favor,continue como és,autêntica,dinâmica e blogueira de primeira qualidade.Parabens.Marluce,em Arez,no Rn-Natal